20.3.10

Dia Nacional da Poesia, 14/03/2010 - Diário de Bordo

O Cristo estava de costas e atrás da grades, cercado de andaimes. Não foi uma recepção calorosa. Na saída, São Pedro mandou a chuva. O que esses caras têm contra a poesia, afinal? De nada valeu a descortesia com que nos receberam e nos mandaram embora lá de cima aqueles caras do céu. Depois de falar poemas no alto do Corcovado, ficamos ilhados no meio do caminho, a passagem do trem interrompida por uma pedra rolada para os trilhos. Exilados num hotel abandonado nas Paineiras, em meio à tempestade, aguardando socorro, que já sabíamos que não viria lá de cima. Fazer o quê? Poesia. Eu saquei a câmera e já não sei quem sacou o primeiro verso. Um mágico tirou um sax da cartola, e a velha recepção abandonada se fez salão de baile. A tempestade ameaçando desabar o mundo sobre nossas cabeças e as nossas cabeças acima das nuvens, como boas cabeças de poetas. Tramando filmes naquele cenário hitchcockiano, com uma trama à la Buñuel e personagens saídos de um filme do Fellini. Tramando passos na escada e vasculhando as áreas interditadas. Vibrando versos futuros nas cordas da chuva. Cristo tem razão de estar emburrado. Poetas já transformavam água em vinho muito antes dele nascer. E nem assim lhe deixaram uma gota. Beberam tudo! Agora andam por aí, recitando milagres, embriagados de chuva...

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