27.3.10

Oscar se prepara para a próxima viagem

"Oscar manda lembranças", meu primeiro romance, finalmente ganhou seu ponto final. Agora aguarda a avaliação da Editora. Gosto tanto deste livro, gerado em 1 ano e 3 meses, mais que um parto!, que vai ser difícil eu aceitar qualquer contrato. Me sinto meio idiota por falar isso. Tanto poeta que sonha com uma Editora e até paga pra editar o próprio livro. Mas este, não! Este só sai por Editora se tiver um contrato bom. Tá decidido. É a Editora que deve pagar o autor, e não o contrário. Pra pagar, eu mesma edito. Já tenho até registro como autora pra editar com ISBN. Mas este eu quero lançar por uma boa Editora e com um bom contrato, porque acho ele suficientemente bom pra isso. E vai ser difícil alguém me convencer do contrário. Eu geralmente desgosto das coisas que eu escrevo pouco tempo depois de escrevê-las. Tenho um amor brutal por este livro! Fruto do meu amor brutal por um grande amigo. O livro é um elogio ao amor na sua forma mais pura e mais livre. Um amor sem explicação, sem data de validade, sem compromisso. Um amor que ora se confunde com paixão, ora com amor de irmão. E que sem ter nenhuma razão, é sempre a razão de tudo. É tão inédito eu gostar tanto assim de algo criado por mim, mesmo com todos os defeitos que eu sei que tem e vou achar na revisão, que faço dele a minha obra prima. Me torno arrogante e pretenciosa e não quero nem saber de quem não gostar. O livro é a minha carta de amor para o Fernando. Eu gosto. Ele também. Acho que isso basta, né? Pelo menos é o suficiente pra me deixar feliz. E a gente sabe como felicidade é uma coisa rara.

26.3.10

sexta à noite

Se pudesse beber, estaria agora vagando pelas ruas, de bar e bar.
Procurando alguma coisa que eu não saberia...
que eu não iria encontrar.
Voltaria pela manhã, bêbada e ainda mais profundamente sozinha.
Dormiria mal.
Acordaria um pouco pior.
Ainda com a sensação de ter perdido alguma coisa...
Ainda procurando.
Ainda sem achar.
Sexta-feira à noite, em casa.
Ouvindo Etta James e trabalhando no meu novo livro.
É, está sendo uma noite agradável.
Gosto do que estou encontrando por aqui.
Gosto do som.
Gosto do livro.
E gosto muito neste momento de estar sozinha.
Mas, não! Não gosto de não poder beber.
Eu queria só uma dose de qualquer coisa.
Queria muito uma dose de qualquer coisa.
Com uma dose de qualquer coisa, poderia passar todas as noites de sexta da minha vida inteira assim... ouvindo jazz e trabalhando em um novo livro.
A cada sexta, um novo jazz, um novo livro.
E uma nova dose de qualquer coisa forte.
Mas se eu pudesse beber, estaria agora pelas ruas, n'algum bar
procurando aquelas coisas sem achar, meio perdida.
Tá certo, vou voltar pro meu livro.

MÚSICA PARA FAZER DANÇAR O BONECO COLORIDO DE DAR CORDA

dia desses
pensei em algo simples
como um telefonema
sei seu número de cor
ainda sei
muitas coisas de cor
sobre você
coisas simples, muito simples
aquele ritual para cortar as unhas
que eu sempre achei esquisito
e a mania de roubar
as folhas das árvores
por toda a cidade
para fazer chá
aquele cantinho para decorar poemas
no jardim
onde fomos recebidos
por uma comissão de macacos-prego
certa vez
teu entusiasmo
com cada brinquedinho novo
e aquele boneco colorido de dar corda
que dançava pra gente na mesa da sala
tua disposição matinal
contrastando com o meu mau-humor
e seu jeito de me arrancar um sorriso
que eu nunca consegui desvendar
sempre soube o motivo das lágrimas
nunca a razão dos sorrisos
é pra essas coisas que não sabemos o motivo
que damos o nome de amor
pra não ter que explicar
eu te amei com aqueles sorrisos
mas isso já faz tanto tempo...
dia desses
pensei em te ligar
coisa simples
mas dizer o quê?
desisti
não encontrei um motivo.

(aí fiz esse poema sem ritmo e chamei de
"música para fazer dançar o boneco colorido de dar corda"
poemas são como sorrisos que chamamos de amor:
não precisam fazer sentido)

20.3.10

Dia Nacional da Poesia, 14/03/2010 - Diário de Bordo

O Cristo estava de costas e atrás da grades, cercado de andaimes. Não foi uma recepção calorosa. Na saída, São Pedro mandou a chuva. O que esses caras têm contra a poesia, afinal? De nada valeu a descortesia com que nos receberam e nos mandaram embora lá de cima aqueles caras do céu. Depois de falar poemas no alto do Corcovado, ficamos ilhados no meio do caminho, a passagem do trem interrompida por uma pedra rolada para os trilhos. Exilados num hotel abandonado nas Paineiras, em meio à tempestade, aguardando socorro, que já sabíamos que não viria lá de cima. Fazer o quê? Poesia. Eu saquei a câmera e já não sei quem sacou o primeiro verso. Um mágico tirou um sax da cartola, e a velha recepção abandonada se fez salão de baile. A tempestade ameaçando desabar o mundo sobre nossas cabeças e as nossas cabeças acima das nuvens, como boas cabeças de poetas. Tramando filmes naquele cenário hitchcockiano, com uma trama à la Buñuel e personagens saídos de um filme do Fellini. Tramando passos na escada e vasculhando as áreas interditadas. Vibrando versos futuros nas cordas da chuva. Cristo tem razão de estar emburrado. Poetas já transformavam água em vinho muito antes dele nascer. E nem assim lhe deixaram uma gota. Beberam tudo! Agora andam por aí, recitando milagres, embriagados de chuva...

19.3.10

Diagnóstico

Não posso mais tomar refrigerantes nem comer as coisas engorduradas de que eu tanto gosto. Diagnóstico: gastrite. O café preto de manhã, a cerveja de noite, tudo cortado. Só permanece o cigarro, que esse eu não consigo, eu não consigo... é demais pra mim! Evito acender o primeiro em jejum. Meu café da manhã era sempre café preto e cigarro e isso até às 2 da tarde, que é a hora que almoço. Agora tomo um café da manhã reforçado. Penso em andar com barrinhas de cereal na bolsa. Não posso mais ficar com o estômago vazio me entupindo de cigarros. Tenho sonhado com as coxinhas de galinha com requeijão do Fornalha, Bic Macs com coca e aquela batatinha que só o Mac Donald's faz, aqueles podrões da Lapa entupidos de maionese e batata palha, churrasquinho, toda a espécie de petisquinho noturno, as fatias de pizza do Guanabara, ah!, todas essas coisas magníficas que eu comia na madrugada depois de me entupir de cerveja em jejum a noite inteira! Não é de se admirar que eu tenha sido presenteada com essa gastrite. Acho até que ela demorou bastante pra se manifestar... Anos e anos maltratando conscientemente o meu estômago, o que mais eu podia esperar? Agora, barrinhas de cereal na bolsa e o gosto longínquo do álcool e da gordura e da cafeína... Essa dor de estômago e eu ainda relutando em me desfazer da nicotina. Vou acender um cigarrinho pra pensar mais sobre isso!

13.3.10

Nunca leve trabalho pra casa!!!

A internet no meu trabalho está um tanto lenta e hoje era último dia de inscrição, então a gente tinha que receber e conferir uns documentos por e-mail. Eu, muito esperta, pensei: vou fazer isso em casa, que com a minha internet vai mais rápido. Às 10 da manhã baixei e conferi a primeira série de documentos, respondi confirmando o recebimento. Atenciosamente, Beatriz. 10 pra uma da madrugada e eu continuo... Atenciosamente, Beatriz. Apenas poucas interrupções, a primeira para almoço, depois banho, jantar, e a quarta, e mais importante!, foi pra descer até o bar da esquina pra me reabastecer de cigarros e trazer umas cervejas. Depois de algumas cervejas a gente vai ficando sincero. Infelizmente, Beatriz. Mais algumas e a gente vai ficando emotivo. Oi querido, recebi os seus documentos, estão todos lindos! Mas eu estou muito cansada, passei o dia inteiro fazendo isso, e então pensei que talvez pudesse desabafar um pouco com você... etc etc. Um pouco mais e a gente pode ficar agressivo. Vai pro inferno! Beatriz. ps. e vê enfia esses documentos no cu! não me enche o saco. (um momento, a cerveja acabou, vou comprar mais e já volto) Pois então, como eu estava dizendo... o que é mesmo que eu estava dizendo? Ah, sim. Mais umas cervejas e a atenção vai pro espaço. Você começa a esquecer as coisas.
- Está faltando o RG.
- Mas eu mandei o RG!
- Ah, sim, é verdade, eu não tinha visto. Tava tão espremidinho ali entre o CPF e o Diploma... rs... Ah, não, peraí. Aguarda um momentinho. Tem alguma coisa errada aqui. Ah, sim! Não, não era o Diploma, era a Ficha de inscrição. Está faltando o Diploma. Eu sabia que estava faltando alguma coisa! Só não sabia exatamente o quê.
Mais umas cervejas ainda, e começa a bater um certo desespero.
Olha, eu sei que vc não me conhece, mas eu sei tudo sobre vc, o seu nome completo, e até já decorei o seu CPF. Acho que temos uma certa intimidade, apesar de tudo. Eu me sinto tão só. É sexta-feira à noite e eu estou aqui olhando para a sua foto 3x4. Sabe que eu acho que a gente tem tudo a ver? Sei lá, alguma coisa nos teus olhos... A nossa identidade termina com o mesmo dígito, não é demais?! Eu tenho certeza que a gente vai ser muito feliz juntos! A gente foi feito um pro outro. É o destino. Não adianta fugir. Qual é o teu signo? (não encontrei essa informação aqui)
Uma cerveja a mais e a total falta de noção.
Pq vc não me respondeu? O que foi que eu fiz? Olha, se eu fiz alguma coisa de errado, vc me desculpa. Não foi a minha intenção. Eu não consigo entender o seu silêncio. Já se passaram 2 minutos! 2 minutos que eu te mandei aquele e-mail! E vc me responde com o silêncio. O que eu devo pensar? Eu não posso acreditar que vc vai jogar fora assim tudo o que nós vivemos juntos! É outra mulher? Olha, se for isso.... só pode ser! E quer saber do que mais? Vai se fuder! É isso mesmo. Vc não representa nada pra mim. E pára de me olhar com esse sorrisinho 3x4, que eu não tô nem aí. Vou pegar o primeiro cara que aparecer, qualquer um. Só não quero mais saber de vc, seu merda!
Bom, aí as coisas já começam a se mesclar, né?! O desespero e a emotividade e a agressividade e etc. A falta de noção engloba tudo. Mas o pior mesmo é quando bate aquela depressão profunda.
Estou te escrevendo pq parei neste e-mail e não consigo prosseguir. Eu simplesmente não consigo. Nada mais faz sentido. Eu tenho um trabalho de merda, uma vida de merda! E pra quê? Pra viver nesse mundo? Não foi esse o mundo que eu escolhi pra viver. Enquanto a gente tá aqui, tem crianças morrendo de fome. E eu aqui tomando uma cerveja e achando que o grande problema do mundo se concentra no meu umbigo. Que é um trabalho maldito, uma vida sozinha... Mas eu não posso fazer nada pela vida dessas crianças e nem pela minha. Mundo cruel! Adeus.
E de repente uma euforia intensa! Um porre se parece bastante com uma TPM. Oscilações de humor... Aí o jeito é sair pra rua, um lugar com som, gente animada, quem sabe uma piscina onde se possa mergulhar pelada, coisas assim. Ir pra rua e se confundir com a massa. Pessoas felizes, falando alto, rindo alto. Pessoas que não têm nada pra dizer falando de tudo. Uma galera despreocupada, que não fala de trabalho. Epa, o que é que eu ainda tô fazendo aqui?

12.3.10

Eu odeio me ver em vídeos. Este tá com a imagem péssima, e ainda me pega de baixo, me engorda, um horror! Mas é um registro de um momento que eu gosto de lembrar, que foi a minha participação no show do Arnaldo, um cara foda, grande amigo, e sobretudo, um gentleman! Arnaldo é raro e participar do show dele foi realmente uma honra.


11.3.10

O INFERNO NÃO PEDE PASSAGEM

o inferno é um despertador tocando ininterruptamente na sua cabeça
o diabo inventou os relógios
só cães e homens usam coleiras
no pescoço, no pulso ou na cabeça
dóceis e domesticados
abanam os rabos
e um despertador toca ininterruptamente
anunciando o inferno de cada dia

o jornaleiro, o padeiro, os sinais de trânsito
e as lojas de conveniência 24 horas
já estão todos lá
abrindo alas pro diabo passar

você pode fugir pra qualquer lugar
o inferno te acompanha onde quer que você vá
é um despertador tocando ininterruptamente na sua cabeça
um outdoor anunciando um novo carro
ou uma nova marca de cerveja
com uma gostosa de lábios grossos
e bunda enorme dizendo: “beba com moderação”.
mas como se pode ser moderado?

felicidade é o papel higiênico mais fofo
o sabão que deixa a roupa mais branca
a pasta que deixa os dentes mais brancos
o hálito mais fresco
a manteiga mais cremosa
a comida mais sadia
e um universo de vantagens

você vai engolir toda essa felicidade
- uma pílula faiscante -
com uma nova marca de cerveja
estupidamente gelada
e dirigir seu velho carro pelas estradas

mas não adianta fugir
o inferno não é esse despertador que te acorda todas as manhãs
para aquele trabalho estúpido que você não suporta
não!
não é este que você programa, ou que você dá corda
que você desliga ou taca na parede
quando bem entende

entenda:
o inferno é um despertador tocando ininterruptamente na sua cabeça

nos bares, nas estradas, nas esquinas
numa cama de motel com a mulher mais linda
no show mais esperado do ano
no jogo mais importante da década
na maior sensação do milênio
dentro de um livro
no fundo de um copo
na fenda da porta
te espiando, sempre
com um ar vitorioso
e um sorrisinho sarcástico
no canto da boca

o inferno se oferece com festa
é a conquista da copa
é a entrega do oscar
é o baile dos desesperados
são os fogos de copacabana
é a vista magnífica do morro do corcovado

compre sua dose diária de felicidade
sirva na mesa
engula com cerveja
e use o papel higiênico mais fofo
pra limpar toda essa merda com suavidade

ou então
só conheço uma maneira de abafar o som do inferno
que toca e que toca e que toca na sua cabeça
berre mais alto, berre muito mais alto
o mais alto que puder
além do que conseguir
exploda os pulmões de tanto gritar!
você pode até abafar o som
você vai conseguir, eu sei, já tentei
só não alimente falsas esperanças
deus não vai te ouvir.

9.3.10

thank you, buk.

sinais de trânsito

os velhos camaradas jogam
no parque olhando o mar ao longe
pondo marcadores ao longo da pista
com gravetos de madeira.
quatro jogam, dois para cada lado
e 18 ou 20 se sentam ao
sol e assistem
percebo isso enquanto sigo
em direção ao banheiro público
enquanto meu carro está no conserto.

o parque abriga um velho canhão
enferrujado e inútil.
seis ou sete veleiros cortam
o mar lá embaixo.

termino a tarefa
saio
e eles continuam jogando.

uma das mulheres usa uma maquiagem carregada
brincos falsos e fuma
um cigarro.
os homens são muito magros
muito pálidos
usam relógios de pulso que lhes machucam
os pulsos.

a outra mulher é muito gorda
e dá risinhos
a cada vez que um ponto é marcado

alguns deles têm a minha idade.

eles me enjoam
o modo como esperam pela morte
com tanta paixão
quanto um sinal de trânsito.

essas são as pessoas que acreditam em comerciais
essas são as pessoas que compram dentaduras a prazo
essas são as pessoas que comemoram feriados
essas são as pessoas que têm netos
essas são as pessoas que votam
essas são as pessoas que têm funerais

esses são os mortos
neblina e fumaça
o fedor no ar
os leprosos.

esses são afinal quase todos
que existem.

gaivotas são melhores
algas marinhas são melhores
areia suja é melhor

se pudesse posicionar aquele velho canhão
contra eles
e fazê-lo funcionar
eu o faria.

eles me enjoam.


Charles Bukowski

8.3.10

Books and Buk

Hoje fui à livraria buscar "O amor é um cão dos diabos" (adoro esse título!), livro de poemas do Bukowski que eu tinha encomendado. De quebra trouxe o "Visões de Cody" do Kerouac - e eu tinha me dito que não compraria este livro (pelo menos não agora com IPVAs querendo engolir todo o meu dinheiro), porque é muito caro. Acontece que eu sou meio compulsiva com livros. Tem uns que eu compro e nem leio... Mas é com livros que meu consumismo aflora. Aí não teve jeito. R$ 79,00 a menos na conta, um belo livro novo na cabeceira. Aliás, dois. (!!!) Comecei com os poemas. E resolvi postar um, já que eu mesma não tenho escrito. Bom, ele fala por mim. É mais ou menos isso mesmo o que eu queria dizer.

alguma coisa

estou sem fósforos.
as molas do meu sofá
estouraram.
roubaram minha maleta.
roubaram minha tela a óleo de
dois olhos rosados.
meu carro quebrou.
lesmas escalam as paredes de meu banheiro.
meu coração está partido.
mas as ações tiverem um dia de alta
no mercado.


Charles Bukowski

2.3.10

ÁLIBI

eu quero um álibi pra minha loucura
um álibi pra noites insones
a garantir que eu não saí de casa
quando minha alma vagava por esquinas, becos e botecos sujos
a garantir que eu dormia sono tranqüilo
quando minha alma pirava, e uivava e gritava sob as janelas vizinhas
um álibi pra garantir o meu silêncio dentro da lei
quando é nessa hora que a minha alma mais grita
um álibi pra deitar do meu lado enquanto eu durmo
e me fazer cafuné nos cabelos
e ver um sorriso se esboçar no meu rosto
sem que eu nem o perceba
mas a minha alma está pelas ruas
bêbada
a brigar com o garçom pela conta errada
e a xingar o motorista que fechou meu carro
com um carro de polícia de faróis apagados
a minha alma não pode ser algemada, não pode ser.
então ela briga com a polícia e xinga essa lua escrota
que faz questão de brilhar quando eu estou triste
VAI SE FODER, LUA! VAI SE FODER, LUA!
é o que eu uivo pra ela com minha alma de lobo
minha alma de lobo que é um cão vira-lata
se virando nas ruas do jeito que dá
minha alma que rasga cheques e queima dinheiro
e taca fogo num posto de gasolina
que bebe sozinha no canto de um bar
eu quero um álibi pra garantir que EU NÃO ESTAVA LÁ
que me arranque do incêndio com um cobertor
e me leve para um local seguro
que me traga cobertas e travesseiros e um beijo de boa noite
mas a noite insiste em não ser boa
não há álibis, travesseiros nem cobertas
não há lugar seguro
apenas a minha alma bêbada, louca e descabelada
vagando nas ruas
uivando pra lua
bêbada, louca, descabelada e perdida
cavando com as unhas as paredes de um beco sem saída
sangrando as pontas dos dedos em total desespero
minha alma bêbada, louca, descabelada, perdida e cansada...
tão profundamente cansada de tudo
tão cheia de tudo
de óculos escuros na manhã que se anuncia
voltando pra casa
sozinha

vazia
"Eu sou a sua solidão"

1.3.10

PODE SER RESSACA

essa coisa na garganta
amarga
pode ser ressaca de uísque puro, cerveja quente e cigarro
mas essa coisa na garganta
amarga e apertada
não é ressaca
é só aquela coisa na garganta
amarga e apertada
que dá na gente de repente
e que a gente não entende
e que faz a gente fumar cigarros,
tomar uísque puro e cerveja quente
(e acordar no dia seguinte com a garganta amarga
e pensar aliviada: “pode ser ressaca”)