22.12.13

I'M GOING BA
dizia o visor do rádio
quando a gente entrava
no litoral sul da Bahia
era Nina Simone - I'm going back home
numa alegria
que Nina Simone
só teria na Bahia
e eu lembrava do meu pai criando galinhas
e eu sentia o cheiro dos coqueiros
e eu já sentia calor na estrada na chuva
e eu estava voltando pra casa
depois de muitas tempestades
o Espírito Santo não colaborou
como nada que vem da igreja católica
e o Natal era apenas pretexto
(e eu sempre me pergunto, por que, afinal,
criaram um Estado para separar a Bahia do Rio?!)
i'm going back home
i'm going BA
i'm going para o colo do meu pai
porque talvez ele precise de colo
porque a gente sempre se precisa
quando a vida - imprecisa -
se veste de morte
e eu me lembro dos filas brasileiros
que ele criava
e eu me lembro das casas boas
e das casas ruins
em que ele morava
e eu me lembro - o tempo todo e sempre -
da minha madrasta
ela teria reclamado daquela carne do sol
que não era carne do sol
e teria fumado cigarros comigo
ao longo de toda a estrada
i'm going BA, Milú
que você escolheu como casa
i'm going meu pai
que você escolheu como casa
i'm going você, amada
de onde eu nunca saí
porque você me habitava
essa chuvinha boba
da qual você também reclamava
- você estaria sentindo muito frio aqui -
essa chuvinha veio
pra disfarçar
as nossas lágrimas
no meio de todos os rostos
molhados
i'm going BA
com uma canção de Nina Simone
pra você
ela sabia ser triste
mas também conhecia
a alegria
de voltar pra casa.
o limpador de para-brisa
pra lá e pra cá
tenta me hipnotizar
(eu sempre resisto)
todas as placas
que marcam a quilometragem
de trecho em trecho
de estrada
parecem chorar
com muita precisão
firmes, fincadas no chão
dizem
o quanto eu me afasto
de você.

16.12.13

um índio
um único índio
resistindo no topo de uma árvore
agarrado a folhas e galhos e desejos de liberdade
agarrado a toda a força da sua ancestralidade
basta um único índio
numa aldeia despedaçada
em pleno século XXI
de concreto e choque
cercado
um índio-pássaro
fazendo ninho
alimentando com o bico os outros pássaros
que ainda não sabem que podem voar
não se sabem passarinhos...
- “eles passarão!”, diria Quintana
o índio não precisa dizer nada
o índio sabe que a terra é a sua casa
se planta no chão
e renasce
a cada século de escuridão
um índio
no topo de uma árvore
resistindo
espírito guerreiro
arco e flecha contra canhão
um índio batendo firme o pé no chão
enquanto o pelotão bate continência
o índio dança
dançar
é a mais bela forma
de resistência.





4.12.13

CONDENADO MORADOR DE RUA PRESO COM PRODUTOS DE LIMPEZA: 5 ANOS DE RECLUSÃO

atenção:
recolham todas as garrafas de pinho sol
das prateleiras do mercado
é questão de segurança nacional!

recolham também água sanitária, detergente,
todas as marcas de sabão em pó
omo cores e omo multiação

removam as vassouras, os paninhos,
sabão em barra e sabão em pasta
tudo o que é produto de limpeza

tem um sabonete nas suas mãos?
- tá preso!
- por quê?!
- posse de material explosivo.

é que tem um povo por aí
querendo limpar o país
de toda a sujeira varrida pra debaixo do tapete

- mas isso é um perigo!

então a polícia não pode deixar ninguém andando por aí
com material de limpeza

tem muita sujeira nas UPPs e no palácio do governo
muita sujeira no congresso nacional,
nas câmaras e assembleias legislativas
muita sujeira na justiça, na mídia
muita sujeira nas mãos de todos
quem têm nas mãos o poder

higienização, pra eles, é tirar de circulação
pobre, preto, favelado e morador de rua
tudo dentro de um camburão

a segurança da nação depende
de deixar decantados no fundo do rio
toda a sua sujeira, os resíduos,
e todos os excluídos
- não se pode revirar o lixo –

atenção: produto de limpeza tá proibido!
bora agora comprar os explosivos...


#vandalismopoético

1.12.13

quando eu digo acabou
era só o começo...
não é que eu me expresse mal
é vício de poesia:
mania de poeta
de falar as coisas
pelo avesso.

25.11.13

Eu te vi, mas fingi que não. É sempre difícil cumprimentar alguém com o coração na mão. Você ia fingir que não viu o coração ali, e ia apertar com força, e depois me lagar lá, com toda aquela sujeira nas mãos. Então eu montei barricadas na mesa da bar, só pra você passar. Talvez você tenha percebido, e visto com o canto do olho que eu apertava com tanta força o coração na mão (pra ele não escapar até você), que tenha me feito o favor de também fingir não me ver. Entre mortos e feridos, restam os fantasmas vagando pela cidade no lugar errado, na hora errada. E um poema tolo sobre coisas tolas pra encerrar a madrugada.

21.11.13

goteira

há uma goteira no teto do quarto
caindo diretamente
sobre a minha cabeça
ela ainda não tinha nome,
então dei o seu.
(como dormir com seu nome pingando
a noite inteira
sobre a minha cabeça?)

20.11.13

Um coração desocupado não significa um coração esvaziado. Desocupado, o coração seria um vagabundo. Mas tal como Kerouac, um vagabundo iluminado. Dormindo em vagões de trem abandonados, e dividindo um vinho de quinta categoria com outros corações, digo, outros vagabundos. Enfim, esses desocupados. Livre, o coração pega carona na boleia de um caminhão sabe-se lá pra onde. Não existe um lugar pra chegar, não há o que fazer; só há esse vento gelado na cara cortando a madrugada, e toda essa estrada. E todas as visões iluminadas que um coração pode ter, como esse insight de perceber equivalência entre desocupado e vagabundo, e resgatar a velha alma beat que une vagabundagem e iluminação! E então a desocupação perde toda a amargura de retirada forçada, e o coração, de lugar vazio. Desocupado, guarda dentro de si o mundo, como todo belo coração vagabundo.

#ocupacoração

19.11.13

Meu coração foi flagrado pela sua transmissão ao vivo... Meu coração foi flagrado num ato de vandalismo, ali, batendo. Por você. Mas meu coração é ninja. Conhece golpes que você nem imagina. Mais do que ninja - meu coração é livre. Continuará batendo. Vandalismo é você não estar mais aqui dentro.

#ocupacoração

18.11.13

Noite passada sonhei que tinha uma marca feia no lugar da covinha, bem funda, só de um lado do rosto. Era estranho... Pensando bem, meu sorriso carrega uma cicatrizinha. 

15.11.13

A ocupação acabou. Era uma Zona Autônoma Temporária. Você não poderia morar para sempre no meu coração. Aliás, meu coração nunca teve acomodações próprias para moradia. Sempre foi lugar de passagem, tipo uma hospedaria. Os viajantes vêm de longe, com seus mochilões, barro na bota, poeira da estrada nos pulmões, se jogam na cama e sentem um imenso prazer em estar ali. Por alguns segundos o meu coração é tudo o que alguém pode querer. Mas a estrada é muito grande pra parar por aqui. Eu mesma me irrito, fico entediada, largo o coração ali e pego sozinha a estrada. Quem precisa de um coração? É sempre uma sensação tão boa esse vento na cara! Quem precisa de um coração, ali, parado? - a cama desfeita e aquela preguiça danada de arrumar o quarto. Ah, mas você acha mesmo que eu devia enfiar o coração no mochilão e carregar comigo?! Você não sabe o quanto pesa! - meu coração é um chumbo. Um gigantesco prédio histórico no centro da cidade – ou você ocupa ou explode de vez. Além disso, não serve pra nada. Mas eu vou fazer com ele uma coisa esperta: na próxima manifestação, a PM vai ter que revistar aqui dentro pra encontrar a pedra.


#ocupacoração
Dessa vez a Guarda Municipal chegou, e destruiu a barraca. Foi logo metendo a mão e te arrastando pra fora do meu coração. Você nem ofereceu resistência. Parece que já tinha um plano de reocupação em outro lugar. Deixou lá a carcaça, a barraca destruída, a lona rasgada, as varetas quebradas. Deixou lá meu coração arrasado no meio da praça, como um enforcado, pra servir de exemplo. Ele então foi se arrastando a um poste, se acorrentou, fez greve de fome. Todo dia grita por liberdade (e todo dia fala baixinho o seu nome). Já está perdendo as forças, desmaiando, enlouquecendo. Esquecido atrás das grades esperando o julgamento. Você, com suas provas forjadas, vai engordando o processo. Cada dia, adia o parecer. Pra você pouco importa se meu coração está preso, se está sem comer. Acho que aquela ocupação era coisa de P2, pra me destruir por dentro. Não adianta amarrar uma camisa na cara e ficar aí, com essa postura de polícia. Você viu quando eu fiz do meu coração um coquetel molotov, e entreguei na sua mão. Você podia explodir em qualquer lugar. Pois é, esse flagrante não foi forjado. Fui eu mesma, e eu estava sem máscaras. Isso consta no relatório? Guardou meu coração como prova? Pronto, agora mais essa pra me incriminar. Taí, pega meu coração e faz o que quiser. Eu já deixei você entrar e ocupar, já dei na sua mão, nunca fui boa com GTs de segurança. Mas vou fazer uma campanha, você vai ver. Anistia internacional, direitos humanos. O mundo inteiro vai saber. Meu coração está sendo investigado, está sofrendo perseguição, O Globo já noticiou que ele é financiado por músicas bregas e poemas de amor. CONTRA A CRIMINALIZAÇÃO DA PAIXÃO, vou botar numa faixa bem grande na porta da sua casa. Vou convocar uma grande manifestação: 1 milhão nas ruas contra a criminalização da paixão. 1 milhão nas ruas pela libertação imediata do meu coração. 1 milhão nas ruas. E eu aqui, sozinha, esperando por um.


#ocupacoração

7.11.13

PREFERÊNCIAS

Eu amo a coxinha com requeijão do Fornalha! Sempre amei coxinha. Não sei por que o termo é tão mal aplicado hoje. Também sempre gostei de pimenta – tenho um pezinho na Bahia. Spray é que é novidade. Pimenta mal aplicada. Sempre gostei de olhares. Olhos nos olhos. E aí pouco importa se tem uma camisa amarrada na cara. Teus olhos nos meus são sempre bem aplicados.

#vandalismopoético + #ocupacoração (combo)


28.10.13

Meu coração havia sido espancado pela polícia. Aí você chegou, vestido de socorrista – soro para os meus olhos. Carregou meu coração no colo, com todos os primeiros, segundos e terceiros socorros. Um black coração, mesmo sangrando, não recua. Então você deu um jeitinho de estancar o sangue e seguir ao lado dele na luta, deixando pelo caminho a roupa branca e catando pra nós uns escudos. Nenhum ninja registrou nosso atentado ao pudor. Nenhuma mídia tradicional pôde noticiar “crime passional”. Então na calada da noite você chegou com uma barraca e reocupou. De fato, a ocupação nunca terminou. Um coração não pode ser encarcerado, nem pode ser desocupado à força. Ninguém pode chegar com um mandado de busca e apreensão e tirar você do meu coração. Pode ocupar. Aqui é seguro. Já podemos desamarrar as camisas da cara.

#ocupacoração

25.10.13

CEP 20.000
NA LONA CULTURAL DA MARÉ
sexta de 19 às 22 h.
entrada franca.

com ...
canto cego
beatriz provasi
luana costa
miríades jr.
adiron marcos
flávia cortez
rodrigo bodão
isadora medella

boradentro.
solte o verbo.
a vida pede.

 

24.10.13

Palíndromo para dor de garganta:
romã amor.

19.10.13

Meu coração ficou encarcerado em Bangu. Meu coração não recebeu o alvará de soltura, e permanece encolhidinho no canto de alguma cela, um pouco assustado, um tanto acuado, sem saber o que fazer, em silêncio, entre lágrimas. Meu coração foi considerado muito perigoso, e por isso agora está jogado numa solitária, sem comunicação com os demais. Meu coração não dorme, não come, emagreceu 10 quilos, já se esqueceu de contar os dias, escreve coisas sem sentido pelas paredes da cela, está enlouquecendo. Não se pode aplicar pena de morte a um coração. A pena máxima seria essa prisão perpétua nas tuas mãos.
#ocupacoração

14.10.13

um amor black bloc
pode usar máscaras
e escudos de proteção
chutar as bombas de volta
atirar as primeiras pedras
pode até mesmo explodir um coração
um amor black bloc não pode ser perigoso
(não mais do que qualquer outro)
mas com os corações pegando fogo
os dois se olham
– com camisas na cara são apenas olhos –
e sonham juntos com um mundo novo.

#ocupacoração

11.10.13

anarquistas sendo perseguidos
em pleno século XXI
os próximos serão os aquarianos
as bruxas também estão na lista


só escapam os que participam
de uma organização criminosa
chamada partido político
com cargo no Estado
e grana no bolso


os poetas serão enquadrados
no crime contra a República
de Platão.


estamos evoluindo...

#vandalismopoético

6.10.13

ATO EM DEFESA DA EDUCAÇÃO

 

 

Abrace um mascarado


Vandalismo Poético - Aldeia Maracanã, 14/09/2013 - Parte 1


Vandalismo Poético - Aldeia Maracanã, 14/09/2013 - Parte 2


#ocupacoração


a triste flauta do índio
e a sua falta
descobri o quanto é difícil respirar
- e as palavras saem abafadas -
com uma camisa amarrada na cara
flauta e melancolia
eu nunca soube usar máscaras
difícil respirar
sem você.


###

Desocupação

Por decisão judicial, será realizada a reintegração de posse do meu coração.
(sim, houve danos ao patrimônio)
A desocupação deverá ser pacífica, a menos que haja resistência.
(corações resistem sempre)


###

Últimas notícias da desocupação

Depois de uma série de atos de vandalismo, como passar meu coração numa máquina de carne moída, fazer um bolinho e engolir, o manifestante agora permanece acorrentado ao meu coração, impedindo a desocupação.


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DESOCUPA CORAÇÃO

O PM jogou as armas, levantou as mãos e disse: "eu me rendo". Impossível desocupar um coração com o uso da força. Os cassetetes se dobram dentro de um coração. Lá todas as armas são de brinquedo, de plástico, com peças coloridas. Bombas de chocolate, essas coisas. E um vândalo à solta depredando tudo. Black Blocs só quebram bancos. Cantoras líricas quebram vidros com a voz. Para quebrar um coração, o silêncio basta. Uma porta que se bate na noite mais triste do mundo, estremecendo e pondo abaixo toda a casa. O ocupante agora está soterrado sob os escombros, aguardando o resgate. O coração deverá ser reconstruído em outro lugar. Não se deve construir corações em áreas de risco.


CARTA A CAETANO VELOSO

 
 
Caetano,  

É com profunda tristeza que te escrevo nesse momento. Nos últimos dias vivemos momentos de horror no Rio, dignos de um Estado ditatorial. Ainda sinto a respiração pesada pela imensa quantidade de gás inalada ontem, e o coração apertado pelas cenas de brutalidade policial que vi e vivi. A praça da Cinelândia virou cenário de guerra. Aliás, não de guerra, porque uma guerra pressupõe dois exércitos armados. O que houve foi um massacre do “exército” do Estado contra a população carioca que se manifestava em apoio aos professores, em defesa da Educação. Contraditoriamente, uma sensação muito boa me invade. A nossa maior arma é a resistência, e soubemos usá-la bravamente – nós, do Ocupa Câmara Rio, que mesmo sob uma chuva torrencial de bombas lançadas do terraço da Câmara e das ruas laterais e com duas invasões truculentas do Choque com cães e cassetetes nas escadarias, permanecemos o tempo todo na ocupação, garantindo a sua continuidade; e os bravos educadores e toda a população que tomava a praça, que a cada dispersão, tomava novo fôlego e voltava. Resistimos por cerca de 6 horas, até que a polícia fosse finalmente embora. Nesse sentido, somos vitoriosos, sobreviventes do massacre do Estado – que, diga-se de passagem, já ocorre há bastante tempo.

Já recebemos todo tipo de ameaça e todo tipo de agressão – da polícia e da milícia. A repressão tem crescido – CEIV, Lei anti-máscara, prisões políticas realizadas de forma arbitrária etc. O que nos fortalece é sabermos pelo que estamos lutando – que está muito além de uma CPI dos Ônibus de verdade ou de um Plano de Cargos e Salários decente para a Educação, mas que essas questões pontuais, pela forma como são tratadas, evidenciam. Nossa luta é por valores sólidos e constantemente esmagados pelo poder econômico aliado à repressão do Estado: Justiça, Democracia, Liberdade de Expressão. A Câmara e a ALERJ, que deveriam representar a voz do povo, estão de portas fechadas, os ouvidos velados para a nossa voz, enfiando bombas nas nossas gargantas. A Justiça permanece de olhos vendados, não para ser igualitária, “fazer o bem sem olhar a quem”, mas para ignorar os desmandos do Poder, para não nos ver. Cabral e Paes permanecem mascarados, com seus discursos prontos para a mídia, e blindados pela força policial.

Há ainda algo que é nossa arma (como a resistência) e nos fortalece (como a consciência): nossa solidariedade. E agora me vêm lágrimas aos olhos, porque em meio a tantas cenas de horror, socorri e fui socorrida, muitas vezes por desconhecidos, que vinham com leite de magnésia e soro fisiológico acalmar a ardência nos olhos e a falta de ar, fui retirada de lugares de conflito por estar tão perplexa e desnorteada que fiquei paralisada, protegi e fui protegida, não por aqueles que deveriam garantir a nossa segurança – esses nos atacavam –, mas pela própria população. Nós cuidamos da nossa proteção, cuidamos uns dos outros, e eu fico honestamente muito emocionada com tudo isso. Uma rede de advogados, socorristas e mídia independente se formou ao longo das manifestações, e nos dão suporte com seus conhecimentos profissionais e sua coragem – muitos são igualmente agredidos e desrespeitados pela polícia e pelo Estado. Resistem. Resistimos.

E em meio a tudo isso, eu me pergunto onde está a classe artística, que já foi tão combativa em outros tempos sombrios. Talvez com o rabo preso em editais do Governo, veículos de comunicação ou empresas patrocinadoras. Talvez com medo. E quem disse que nós não temos medo? Ninguém quer ser o próximo Amarildo. Mas muitos outros Amarildos virão enquanto nos calarmos. O medo não calará a nossa voz. E a dos cantores? E a dos atores? Só ecoarão a portas fechadas entre as paredes dos teatros e casas de shows? Como Arnaldo Brandão já deve ter lhe dito, eu sou poeta e performer, e não vejo outra forma de usar a arte nesse momento que não seja como arma de combate. A minha poesia chuta bombas de gás de volta para a polícia. É uma poesia que vê os pombos desnorteados sem saber para onde voar enquanto chovem bombas do alto do prédio. Não poderia ser diferente, pois antes de ser poeta, sou um ser HUMANO. Me dirijo a você, Caetano, pois foi um dos poucos artistas conhecidos do grande público que teve coragem de se manifestar em apoio às lutas populares.

Gostaria que toda a minha carta fosse em agradecimento à menção que fez em sua coluna de domingo no Jornal O Globo ao meu convite, em nome do Ocupa Câmara Rio, para que trouxesse a sua música e a sua presença para a Cinelândia, somando-se à nossa luta. Mas foi preciso dizer mais, e há ainda muito que não foi dito. Agradeço imensamente as suas declarações de apoio a nós, aos professores, aos ninjas, aos mascarados, a todos que permanecem firmes na luta. Suas declarações podem ajudar a mudar a opinião pública construída pela grande mídia e pelo discurso dos representantes do Estado de que somos todos um bando de “vândalos” e de que merecemos ser massacrados (como foram os professores na violenta desocupação do interior da Câmara na madrugada de domingo – vândalos?!). Lembro, ainda, que você, como um artista de projeção internacional, pode ajudar a divulgar ao mundo o que estamos vivendo. Por tudo isso, querido, reforço o convite. Venha quando puder – permanecemos aqui – RESISTIMOS. Mas venha somar sua voz à nossa, porque estão fazendo de tudo para nos calar.
Seguem abaixo os meus contatos.

Com amor,
Beatriz Provasi
Ocupa Câmara Rio, 02/10/2013.

COLUNA DO CAETANO NO GLOBO DO ÚLTIMO DOMINGO:
http://oglobo.globo.com/cultura/marina-onibus-professores-10190508#ixzz2gWE57WYd

8.8.13

tire as crianças da sala

quando eu era criança, brincava de “polícia pega ladrão”.
criança inventa cada uma! 

eu ainda sou criança, mas já sou mais esperta.
em vez de pega-pega,
me peguei num pique-esconde:
“polícia esconde morto”.
o jogo consiste em descobrir
onde foi parar
o corpo.

7.8.13

Zine Vandalismo Poético

2ª edição do fanzine "Vandalismo Poético", com mais textos e novo layout. Lançamento no Fora Cabral dessa quinta: https://www.facebook.com/events/604274242945833/

 
Etimologia: Na língua portuguesa, pacificação deriva da palavra paz. O Rio de Janeiro é um Estado poético, reinventou a palavra; fez rimar com guerra. Nas Unidades Pacificadoras já não se pergunta mais pela paz, se pergunta onde jaz. Mas Cabral é mau poeta. Pegou pra Cristo um Amarildo, que tem Amar no nome. Perdeu o bonde, caiu do helicóptero, retornou às caravelas. E os novos índios convocarão tempestades antes do barco aportar. E dançarão nus, no seu próprio idioma. A etimologia indígena é muito precisa. Um pássaro amarelo será sempre um pássaro amarelo.

21.7.13

vem aí...
coquetel moloToffee.

pq não é só a PM q vai mandar bala...

 
 
 
# vandalismo poético #

da série "vandalismo poético":


a PM vandaliza
Cabral cabraliza
e a gente
que não é besta
devolve um sorriso
de Monalisa


estilhaços

flores para os vidros mortos
esse vidro morreu jovem
era um revolucionário
aqui jaz um vidro
o que esse vidro fez por nós
nós nunca esqueceremos
esse vidro sempre protegeu
o lado de dentro.


mil pássaros em nossa voz

entre o temporal e a barreira policial,
dançar na chuva.
sentar no colo do chão
desafiando os carros
e os camburões
liberar o trânsito
de todos os nãos interditos
e astronautas das nossas luas diárias,
fincar o sim da vida no meio do asfalto.
se nos querem silêncio,
cantar mas alto.
há ainda algo sobre a voz a ser dito:
ninguém pode impedi-la de entrar
ela salta os muros, cruza os portões
há mil pássaros em nossa voz
nós temos a liberdade no grito.
 
depoimento de um recente preso político em sua defesa: 
 
Sr. representante do Estado,
 
as nossas pedras
não são desacato
apenas as estamos
tirando
do sapato.


11.7.13

ManiFestival Fora Cabral

Domingo, dia 14, 15 horas 
Largo do Mahcado

Poetas, performers, atores, músicos, artistas em geral... fazendo da arte arma de combate. FORA CABRAL! Pela desmilitarização da polícia. Liberdade de expressão e manifestação. FORA BELTRAME, ABAIXO A PM!

15h: Concentração, com pintura de faixas e cartazes;
Começo do sarau&manifestação.
21h: Cortejo até a casa do Cabral.

 L
ink do evento no Facebook: http://www.facebook.com/events/541267079268689/


VAMOS NOS JUNTAR AO ATO GERAL: http://www.facebook.com/events/398362753617244/


10.7.13

Festival Fora Cabral

Inauguramos na FLIP o Sarau Fora Cabral. mas aqui as adesões estão crescendo... vamos ter músicos, poetas, atores, toda a gente... aqui vai virar Festival. Domingo. Na Praça Cazuza, provavelmente. No fim de tarde, muito provavelmente. Divulgaremos detalhes bem breve. Guarda a data, e vem com a gente, bicho, desafinar o coro dos contentes!




eu bem que tentei ler você

de repente me lembrei
que esqueci
de você
como quem pega um livro pra ler
e na décima página
se flagra acessando mil coisas
no facebook
ou trocando os canais
da TV
folheando outros livros já lidos
pra rever
aquelas passagens preferidas
o mundo era grande demais
pra eu me concentrar
em você
você era um bom livro
tenho certeza disso
mas se o livro não te pega de jeito
logo no início...
já era.
você já era, meu bem.
outro livro esquecido na cabeceira
que logo vai para a estante
amarelar as páginas
intocadas.

4.7.13

SARAU FORA CABRAL na FLIP

Dia 06/07 (sábado), às 17 horas, na Praça da Matriz - Centro Histórico de Paraty.

Link para o evento no Facebook:
http://www.facebook.com/events/302757089861357/


Em meio a intensas manifestações populares, e diante da violenta repressão do Estado, a poesia taca pedra no vidro, entorta as grades, e vai pra rua gritar Fora Cabral em verso e prosa. A maniFESTAação ocorrerá durante a Festa Literária Internacional de Paraty, no meio da praça, enquanto o mercado editorial se confraterniza com seus autores nas tendas. Na ocasião, será realizada a leitura do MANIFESTO POEMA PEDRADA - VANDALISMO POÉTICO, cujo texto está em construção e aberto a colaborações até sábado de manhã. Publicarei aqui o trecho inicial. Poetas de todo o mundo, mandem contribuições. E convidem os amigos e os amigos dos amigos... Vem, bicho, desafinar o coro dos contentes!

MANIFESTO POEMA PEDRADA – VANDALISMO POÉTICO

Em tempo de intensas manifestações populares, e violenta repressão do Estado, a poesia não deve adormecer nos livros. A poesia tem que ir pras ruas; ser falada, pichada nos muros, riscada nos corpos. O poema deve soar como uma pedrada, um vidro quebrado, uma bomba. É chegada a hora do vandalismo poético!
Os verdadeiros vândalos estão no poder, e querem nos dizer aonde ir e o que fazer. Não através da fala, mas no discurso da bala. Nos expulsam das ruas com bombas de gás lacrimogêneo. Já não sabemos se são lágrimas de gás, tristeza ou revolta que trazemos nos olhos. Atiram balas de borracha nas avenidas, e mandam chumbo nas favelas. A poesia não pode sair ilesa. A poesia foi atingida no meio da testa, e sangra. Não há mais espaço para poemas limpinhos e bem comportados. O poema hoje tem sangue, suor e lágrimas. É feito de corre-corre, confusão. É grito e explosão. Não tem o ar estagnado dos concretos dos prédios dos muros... Se move e atinge alvos: é poema pedrada!

(Essa é a minha proposta para o trecho inicial do manifesto. Recebendo colaborações...)

30.6.13

tem uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tem uma pedra
e a pedra
bem ou mal
é mais sólida que o gás
o mundo tá pegando fogo, baby
vem cá, q eu tenho o vinagre certo pro teu gás lacrimogêneo
eles querem que a gente faça lágrimas
e a gente faz sorrisos
e só isso

e isso é lindo
a gente faz um esforço danado
pra chegar na coisa mais simples
nem a teoria mais revolucionária
ou mais golpista
resiste à prática
do nosso
amor

24.6.13

sabe quando vc acorda meio de ressaca
olha em volta
e não sabe muito bem onde vc está?!
é mais ou menos assim q muitos estão
acordados agora
se esse é o seu caso, meu amigo
não saia pondo abaixo as paredes da casa
se levanta, dá uma caminhada,
toma um café, joga uma água fria na cara,
olha com calma
e tenta reconhecer tudo em volta
talvez vc esteja derrubando as paredes
da sua própria casa.

22.6.13

poesia no front, Rio, 20 de junho de 2013

Poesia no front 1

uma neblina paira sobre o rio
e um cheiro ardido

de ditadura

Poesia no front 2

lágrimas nos olhos...
gás lacrimogêneo ou tristeza?!

tanto faz
tudo volta
como
revolta

Poesia no front 3

agora já pararam as bombas e os helicópteros,
e os passarinhos cantam no amanhecer...
e algo no canto deles me diz "vem voar"...
e eu vou!
quanto mais o poder tentar nos encerrar,
mais a gente vai dizer q só começou!

NOTICIÁRIO

os vândalos atiraram bombas de gás
os vândalos atiraram balas de borracha
os vândalos atiraram spray de pimenta na cara
e atiraram até mesmo com armas de fogo
os vândalos cercaram todas as ruas
os vândalos chegaram com carros, cavalos, escudos
helicópteros, redes de TV
os vândalos NÃO QUEBRARAM TUDO
quebraram TODOS
há muitos anos
os vândalos andam saqueando
os nossos bolsos
os vândalos acham que vão nos sangrar
com quem quebra um vidro
mas um vidro quebrado
não sente a dor de ser quebrado
um vidro não reage
que nos aguardem os vândalos que estão no poder:
nós reagimos!

19.6.13

NU MURO

cansei de escrever no meu próprio corpo
agora vamos escrever no corpo do mundo



 

15.6.13

Olha, você esqueceu uma coisa aqui em casa. O seu cheiro. Ele se escondeu nas dobras dos lençóis e não me deixa dormir. Ele me faz cócegas nos pés. Ele surge sorrateiro debaixo dos travesseiros, e brinca com os meus cabelos. Ele está bagunçando tudo aqui, não para quieto. Ele até recita Clarice, você precisava ver. Olha, isso não está certo, largar o cheiro assim, sem mais nem menos, na casa dos outros. Eu não sei o que fazer com ele. E o que ele faz comigo, sem você, não tem graça. Faça o favor de vir buscá-lo, sim? Quando você vai embora, deve levar tudo o que é seu. Inclusive, eu.

10.6.13

IMERSÃO NA FAZENDA

ou relatório em 2 dias
para minha orientadora de Mestrado

na fazenda da Malu
tem vaca e tem cachorro
tem formiga e carrapato
queijo curando, pimenta ardida
e farofa amarela
tem o mel das abelhas
que ela encanta
pra adoçar a tarde
tem trem de carga
do lado de lá da estrada
e pra lá de pra lá
diz que tem um rio

aqui
a gente tenta
fazer mexer
a cabeça
pra encaixar
no braço e no pé
parece que vai dar pé...
embora isso pareça assim
meio sem pé nem cabeça

tudo se encaixa
e vira luz
projetada nas finas paredes
do tempo
- transparências na caixa da noite

toca o sino da comida
e todas as letras brincam
na língua da Luiza
fazendo cócegas
na barriga

queijo torrado
e vinho gelado
fazem a cama
pra deitar um bom papo

o trem mais uma vez desliza
sobre os trilhos dos meus ouvidos
com todos os seus vagões e apitos

a vaca mais uma vez apita
os galos ainda apitam
os grilos
e até os passarinhos
apitam

só no silêncio
há sons infinitos

à noite
a fazenda da Malu faz medo
quando todos dormem
e os retratos saltam dos quadros
e dançam rangendo os assoalhos da casa
na minha mente mal-assombrada

o trem da madrugada
também deve carregar seus fantasmas
estremecendo as paredes das casas
por onde passa

insetos esquisitos
fugidos do escuro
rondam minha lâmpada acesa
- insetos também têm medo,
concluo e durmo.

na fazenda da Malu
chamada Berros da Maritaca
tem bom dia e café forte
pra espantar o que sobrou da noite

na varanda
da fazenda da Malu
tem uma cadeira de balanço
onde eu fumo
e finjo ter sono
e um poema se balança
nos meus sonhos