4.8.08

pra decorar no chuveiro ou escrever em portas de banheiro

de repente me veio a palavra banheiro
a amplitude que tem o termo
o quanto da minha vida se costurou no banheiro
tem gente que canta no chuveiro
às vezes eu canto
desafinado
mas no boxe, enquanto esfrego os cabelos,
me ensabôo, deixo a água correr pelo corpo
eu falo poemas recém decorados
esfrego até fixá-los na minha pele
torná-los parte do meu corpo
esse poema vem decorado com água quente,
shampoo pantene e sabonete lux
dá até pra sentir o cheirinho de banho tomado!...
mas o poema veio tarde na minha vida
o banheiro veio antes
vem lá do medo de criança
que acorda assustada de madrugada
com vontade de fazer xixi
o medo de atravessar o escuro do quarto
o silêncio da noite
a inexorável solidão da privada
às vezes eu dormia apertada
ou abria a porta, acendia a luz e acordava a casa
depois eu descobri que a solidão me era necessária
mesmo pra espantar os meus fantasmas
e era no banheiro, trancada, encolhida, que eu sempre chorava
também às vezes conversava com o espelho,
como se fosse ele o meu amigo imaginário
vez por outra ainda me pego conversando com o espelho
ou agachada no chão frio a trancar as lágrimas no banheiro
às vezes me encaro por horas e horas e horas
sem dizer uma palavra
e nesses momentos eu me digo tanto
que chego quase a me entender
aliás, banheiro também é lugar de prazer
foi trancada nele que eu aprendi a me conhecer
e me dei muitos orgasmos antes de compartilhá-los
(me dou sempre, quando tenho vontade)
e quando descobri o bom de compartilhar orgasmos
também compartilhei alguns banheiros
e eu vou contar um segredo:
até de ônibus interestadual!
quando é incontrolável a vontade de sexo,
olha em volta:
tem sempre um banheiro por perto
às vezes falta na hora do aperto
ou não tem papel
mas quem é safo sempre dá um jeito
agora o que dizer, pra quem gosta de ler, de literatura de banheiro?!
não sou muito de escrever nas portas
mas eu sempre leio
da fulaninha que ama fulaninho
à filosofia de banheiro, que é incrível!
é, porque tem gente que senta na privada
e se acha o próprio pensador
desculpa se o assunto não é apropriado
mas é parte da minha experiência com banheiros
e também já me rendeu boas risadas
agora banheiro, banheiro bom mesmo,
pra qualquer coisa,
não tem jeito,
é sempre o de casa.
e é nele que eu me tranco pra chorar poemas
decorar as lágrimas
quebrar às gargalhadas
acordar o espelho
vomitar ressacas
enxugar as mágoas
enxaguar orgasmos...
e quando eu quero,
eu sei que eu posso juntar tudo
e botar pra fora
na mesma
descarga

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