30.8.05

Inverno da alma

Minh’alma corre branda
Nesta noite invernal
Silenciosa, sussurra-me algo ao pé do ouvido
Redobro a atenção para captar palavras fugidias
Que se perdem ao vento, rodopiam, evaporam sem adeus
E riem da minha tentativa vã
Esse sussurro doce e malévolo
Atormenta-me num segundo
Não entendo, meu deus, não entendo
Que me diz mi’a própria alma
Minh’alma corria branda
E agora se angustia
Atordoada, sinto pesar-me a fronte
Corro quente em mim
Piso em cacos que me talham a carne
Escorre-me um sangue grosso
Que me apavora
Apavorada, sinto pender-me o dorso
Numa tontura lânguida
Jogo-me para trás
Caio lenta em mim
Vejo-me estirada ao solo
Contorcendo-me, doída, medrosa, envergonhada
Dói-me a alma nesse sussurro infindo
Nessa sugestão inalcançável
Nessa ânsia insuportável de ser
Ouço um grito aterrador
Quem gritou?
Ninguém mais há neste perímetro
Além de meu próprio corpo contorcido
Em duro embate com minh’alma
Gritos e sussurros povoam meus tímpanos
De acordes magistrais
Já não sei bem de onde vêm
Se do fundo da alma
Ou das cordas vocais
Num corte profundo
Jorro o líquido da vida
E minh’alma corre livre
Ao encontro do infinito...

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