11.2.10

O dia em que Rocky desistiu da luta


Não, não, não é nada disso. Aquilo que eu falei, olha, esquece. Esquece esse meu ar decidido. A palavra firme fincada na minha boca. Esquece tudo isso. Todo o sinal e demonstração de decisão e força. Eu choro, sabia? Eu também faço essas coisas... Não, não é todo dia. Tem dia que eu até sei o que eu tô fazendo. Mas geralmente eu não sei... Se eu faço com ar firme e decidido foi porque aprendi assim. Sei lá, a gente tem que ser forte. É que nem no teatro, tem que ter verdade. Então eu vivo com verdade uma coisa que é tudo mentira, esse meu personagem. Eu sou uma mulher livre que faz o que quer. O problema é que nem sempre eu sei o que eu quero... mas e daí? Vou ficar confusa, histérica e deprimida? Virar "mulherzinha"? Ficar abrindo a guarda pra neguinho passar por cima? Aqui ó! Só que essa força toda tem me enfraquecido um bocado... porque eu não caio no ringue e só tomo mais e mais porrada. Eu vou sair que nem o Rocky da luta todo estropiado. É assim que eu fico, com a cara arrebentada. Chorando convulsiva, soluçando que nem criança. É porque eu agüento a porrada. Eu choro de ser forte, não é de fraca. Mas me sinto uma criança perdida dos pais no meio de uma multidão apavorante. Sozinha sem o endereço de casa. Balbuciando entre lágrimas qualquer coisa ininteligível que não ajuda ninguém a me ajudar. Mas quem iria me ajudar? Quem me olha não vê a criança. Vê o Rocky. O King Kong. O Rambo. Sei lá. Uma coisa grande, forte e invencível. Difícil de derrubar... E que ironia...! Qualquer rasteirinha me põe no chão. Eu sou um bebezinho indefeso na carcaça de um lutador, tomando porrada num cercadinho que pode ser ringue ou berço. Chorando a noite inteira... silenciosamente. Se eu tô te falando isso é porque quero que você saiba com quem tá lidando. Não me derruba do berço, porra! Me embala no colo de vez em quando... Me conta umas histórias bonitas pra eu dormir. Como aquela da princesinha que a minha mãe me contava. A princesinha sempre tinha o meu nome. Era um carinho criar a história de uma princesinha com o meu nome. Me faz um carinho de vez em quando... Eu cuspo fogo, mas eu não sou o dragão, eu sou a princesinha, porra! Não desembainha a espada pra mim. Você vai me machucar. Caramba, eu tenho toda essa armadura, mas eu me machuco muito. Aí depois é um trabalhão fazer os curativos e tudo mais. E ficam aquelas cicatrizes feias. Isso numa princesinha linda e esvoaçante não cai bem. Então pára de puxar meus cabelos, vem me fazer umas tranças e fica tudo bem, ok? Eu sei que você não tinha sacado nada disso. Por isso eu te contei. Agora o Rocky vai desistir da luta sem maiores explicações, deixar o público estupefato, e ir pra casa tomar um bom banho e dormir sossegado, aguardando alguém que venha cuidar com carinho dos seus machucados.

2 comentários:

jupyhollanda disse...

quemfez alguma coisa com vc, amiga? me avisa que a princesa Fiona vai lá e dá uns sopapos bem dados no danado.

te amo!

B-Ju

Beatriz Provasi disse...

não é nada específico. às vezes só um silêncio já pode ser uma grande porrada. mas a culpa é minha. eu me jogo no ringue, depois não tem como desviar a cara. mas é como eu falei, desisti da luta... agora, se ele quiser, vai socar as paredes. e vc, quando vai oferecer as paredes pra ele socar? te amo, amiga! tô aqui esperando vc me ligar. beijos