7.8.12

“(...) América, essa palavra, o som é o som da minha infelicidade, a articulação da minha velha e estúpida tristeza – minha felicidade não se chama América, ela tem um nome secreto menor mais pessoal mais risonho – a América está sendo procurada pela polícia, perseguida em Kentucky e em Ohio, dormindo com os ratos pelos currais e uivando os shingles metálicos que revestem os silos escuros dos fugitivos, é a figura de um machado na True Detective Magazine, é a noite impessoal nos cruzamentos e entroncamentos onde todo mundo olha para os dois lados, para os quatro lados, ninguém dá a mínima – a América é onde você não pode nem chorar por você mesmo – É onde os gregos dão um duro danado para serem aceitos e às vezes eles são de Malta ou do Chipre – a América é o que pôs na alma de Cody Pomeray o ônus e o estigma – que na forma de um policial à paisana cagou ele a pau numa salinha dos fundos até ele falar sobre um troço que já nem é mais importante – a América (MÁFIA DE JOVENS SEXO DROGAS CARROS!!) é também o neon vermelho e as coxas no motel barato – É onde à noite os bêbados trôpegos começam a aparecer como baratas quando os bares fecham – É onde as pessoas, as pessoas, as pessoas choram e mordiscam os lábios pelos bares e nas camas solitárias e se masturbam de um milhão de jeitos diferentes em tudo que é cantinho escuro – Tem estradas malignas por trás de tanques de gasolina onde cães assassinos rosnam atrás das cercas de tela e os carros da radiopatrulha de repente surgem como carros de fugitivos mas de um crime mais secreto, mais sinistro do que as palavras conseguem descrever – É onde Cody Pomeray aprendeu que as pessoas não são boas, que elas querem ser más – onde aprendeu que elas querem fugir e brigar, e que em vez de fazer amor elas rosnam – a América transformou o rosto de um jovem garoto em ossos e com tinta escura pintou olheiras nele, fez das maçãs do rosto uma pasta branquicenta e entalhou vincos naquela fronte marmórea e transformou a esperança cheia de vida na sabedoria silenciosa de lábios grossos que não dizem nada, nem para si mesmo no meio da maldita noite – o tilintar dos pires na triste triste noite – O trabalho gorgolejante de alguém na pia de uma lanchonete (na aridez vazia do Colorado a troco de nada) – Ah e ninguém se importa mas o coração no NOSSO peito vai reaparecer quando os caixeiros-viajantes morrerem todos. A América é uma latrina solitária. (...)”
JACK KEROUAC, em VISÕES DE CODY

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