22.4.08

Atrás da Lola

para o Felipe e seus olhos que não me vêem

Folhinha Verde, 1987.
Quando eu tinha 6 anos, tinha 3 garotos apaixonados por mim. Um era um anjinho de história em quadrinhos, seus cachos loirinhos, os olhos azuis, e seu ar doce, tão doce que me causava enjôo. O outro era um gordinho desbocado. Desbocada eu também era, mas ele era estúpido e mal-educado, um protótipo do playboy que deve ter se tornado (eu o achava parecido com o Brutus da Olívia Palito). O outro era um menino chamado Felipe que eu chamei namorado. Tinha cabelos castanhos, lisos, olhos expressivos, era bem parecido comigo. Foi dele o meu primeiro beijo, atrás da Lola, no recreio. A Lola era um elefante cor-de-rosa com laço de fita plantado no pátio. A tromba era o escorrega. Foi um beijo com a mão na frente da boca. Mas eu nunca me esqueci daquele beijo atrás da Lola, com gosto de pacto, de segredo. Meu primeiro namorado. A gente terminou a alfa e ia fazer prova pra mesma escola. Ele não foi, não fez a prova. Eu fiz, passei. Nunca mais o vi. Foi minha primeira decepção amorosa. Acho que ainda carrego a sua ausência comigo. Sequer pude tê-lo como amigo. Nem pude odiá-lo. Ele simplesmente desapareceu da minha vida, como se jamais tivesse existido.
Passaram-se 10 anos até que eu elegesse um novo namorado, e eu nem o amava. O tempo passou, namorei outros caras, amei, fui amada. Fui mais amada que amei, sempre rejeitando anjos e homens brutos. Sempre buscando aqueles olhos castanhos, expressivos, sinceros como o olhar de uma criança, espertos como uma criança esperta. Sempre com medo da solidão, sempre essa ausência. Tenho a impressão de nunca mais ter levado ninguém pra trás da Lola, para um beijo com a mão na boca. Hoje faço sexo no pátio aberto, no trepa-trepa, na gangorra, na montanha russa! Mas aquele cantinho escondido atrás da Lola ninguém mais conhece. E ninguém nem percebe que é lá que eu estou escondida, aguardando um beijo, apenas um beijo. Um beijo inocente com a mão na frente. Um beijo de amor.
Você me lembra o Felipe. Não o beijo. Mas os olhos. A ausência.

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