20.4.09

UM SINISTRO (COMO NOS TERMOS DO SEGURO)

As coisas são sempre por um triz
Por um triz a batida não foi na porta do motorista, no caso, eu
Por um triz eu não perco a vida ou me estrepo toda
E teria sido por um triz que eu não teria avançado aquele sinal, ou que teria avançado o anterior, porque eu parei no primeiro, mas o medo não me deixou para duas vezes seguidas no mesmo lugar em que eu tinha sido assaltada há pouco tempo
Eles nos levam tudo instaurando esse clima de medo, levaram o meu celular, ferraram meu carro e podiam ter me levado a vida, por um triz
Se o motorista do outro carro tivesse freado, a batida teria sido na porta do meu lado
Ele passou pouco antes, e batemos frente com lateral dianteira
Por um triz eu não bato na porta do carona onde estava a mulher dele, por um triz a mulher dele saiu inteira, sem nenhum arranhão
O carro ficou todo ferrado, mas por um triz estávamos os três inteiros
Eu tremendo e chorando e não achando o maldito cartão do seguro na bolsa, e não conseguindo montar o triângulo, dependendo da ajuda de estranhos
Eu tremendo e chorando sozinha de madrugada olhando o estrago no meu carro e no carro dele, enquanto ele calmo chamava a polícia pra fazer ocorrência
Não sei se a calma dele me acalmava ou me deixava mais nervosa, eu só pedia desculpas, tremia e chorava e me sentia engolida por toda a solidão e desamparo do mundo
Foi só um segundo, eu não vi, só senti a batida, e por um triz... Por um triz não acontecia, ou seria pior, por um triz...
Depois de acionar a polícia, o seguro, o reboque, duas horas depois eu estava em casa, tão cansada...
Mas agora a imagem da batida, mais que a imagem, a sensação, porque eu não vi nada, aquela sensação não me deixa dormir
A sensação de um segundo, o barulho, a porrada, o cheiro de borracha queimada, e eu sem saber se desligava o carro, puxava o freio de mão ou ligava o pisca alerta, ou tirava o freio de mão e saía logo do carro antes que um outro viesse na minha direção... eu saindo do carro tremendo ainda sem saber direito o que estava acontecendo... meu deus, o que eu faço, eu nunca bati com o carro? O casal sai do outro carro. Vocês estão bem? Estão. E eu sento no meio-fio e começo a chorar porque eu não acho na bolsa o cartão, o celular, e nem sei pra quem eu devo primeiro ligar... Eu não acho o documento do carro, a carteira de habilitação, e nem sei o que devo falar. Pro casal eu só peço desculpas. Desculpa, desculpa, desculpa... Eu tive medo de parar.
E agora eu não consigo dormir, porque eu queria esquecer, mas eu preciso lembrar. Eu que freqüentemente dirijo sob efeito de álcool, eu não tinha ingerido uma gota de nada. Eu preciso lembrar pra descobrir o que foi que eu fiz de errado. Avançar o sinal? O motorista do reboque veio avançando até Niterói. Todo mundo avança sinal de madrugada. Porque uma menina sozinha no carro não avançaria?! Como foi que eu não vi o outro carro que vinha? A rua parecia tão deserta... Será que a culpa foi minha, ou não estaria ele muito acelerado? Como eu não vi? Eu avanço os sinais vermelhos de madrugada, mas também sempre reduzo nos verdes, porque eu sei que todo mundo avança, então reduzo por segurança. Ele não reduziu, não me viu. Tudo bem, tava verde pra ele, mas por que ele não reduziu? Até bêbada eu faço isso, meu deus! Principalmente bêbada, fico mais cautelosa, por me saber a priori errada. Mas desta vez eu não tinha bebido nada, só água. Só tinha medo de ficar parada, e um pouco de pressa de chegar em casa. Nem cansada eu estava...
Agora tá lá o meu carro todo ferrado, eu ainda sem saber o valor do estrago, mas já sabendo que o seguro não cobre tudo e que eu não tenho um tostão pra bancar o conserto.
Agora ta lá o meu carro ferrado, e eu aqui com a sensação da batida a me despertar toda hora que eu me entrego pro sono. Como se o sono fosse aquele segundo de distração, onde tudo aconteceu por um triz.
Por um triz, eu bati. Por um triz, não consigo dormir.
Aí eu desci pra comprar uma cerveja e vi lá embaixo meu carro amassado e pensei: que merda! Aí eu desisti de dormir. Agora só tomo a minha cerveja e fumo o meu cigarro... Não há nada o que fazer. Só lembrar ao máximo, pra depois conseguir esquecer
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4 comentários:

Tchello Melo disse...

Que perrengue, Bia! Apesar dos estragos materiais, ainda bem que está tudo bem com você, querida!

Beijos!

jupyhollanda disse...

ô amiga, como isso???
call me!!!

missa ya!

B_Ju

Vanessa disse...

Caramba Bia! que situação essa hein?! agora nada mais tem o q fazer..mas conseguí visualizar tudo ao ler seu texto-relato. Brabeira passar por isso e estar só na hora. Mas que bom que estás bem. Carros, objetos, lataria, tudo isso aqui fica. Que bom que sua poesia, sua integridade física está intacta! respira fundo e siga em frente! beijãoo :******

Beatriz Provasi disse...

já tá tudo bem, queridos! valeu a força. beijos