16.1.07

Esculpida por Camille

L'abandon, de Camille Claudel

Quando os olhos secam e a alma serena.
Quando nada vale mais a pena.
Quando tudo perde o gosto, que nem há mais amargura.
Quando não há sim nem não talvez, que só resta um tanto faz como tanto fez.
Só quando se passa da esperança ao desespero, e daí a uma resignada espera confortavelmente deitada pelo que se sabe que não virá.
É só neste momento de desamor que não é ódio.
Quando a solidão já dissipou toda a melancolia de quem não queria ser tão só.
Quando me faltam palavras para descrever uma falta de que não sinto falta, uma ausência que não é saudade, esses sentimentos que não sinto.
Quando nada pulsa e o sangue me corre morninho nas veias.
Quando eu morro como quem adormece com olhos abertos e um sorriso suspenso esquecido na boca.
Nesses momentos sólidos de temperatura amena coloridos em tons pastéis.
Nesses momentos não cabem poemas, que são de matéria-prima um tanto etérea.
Tendo apenas pedra como matéria, assim se traduz meu coração:

Uma escultura de perdas talhada por mãos de Camille Claudel.

12.1.07


Atenção, não saiam às ruas a partir da próxima semana, se têm amor à própria vida!
EU SOU A MAIS NOVA MOTORIZADA DA PRAÇA!!!
Os postes que se cuidem!... As velhinhas que não atravessem a rua!...
Eu e meu Uno Mille 1.0 Fire Flex Prata Bari zerinho seremos parceiros inseparáveis!!!!
Adeus 47, 30, 53!
Adeus 996, 709, 565!
Adeus, Barcas, adeus!
Táxi nunca mais!
Van jamé!
Au ravoir, ralé!
Me uno ao Uno.
E lá vamos nós!...

10.1.07

CONVOCAÇÃO ORDINÁRIA

Convoca-se por meio desta todos os poetas, literatos e simpatizantes, loucos ou não, para o ato poético do dia 27 de janeiro de 2007, sábado, em Niterói. O expresso descarrilado de canelas e idéias se concentrará embaixo do monumento com um verso do Ferreira Gullar no final da Av. Amaral Peixoto, esquina com Marquês do Paraná, às 9h30, e partirá em fila finlandesa às 10h rumo ao terminal de ônibus no centro de Niterói. No caminho, abordaremos os populares com paródias do panfleto nosso de cada dia. Logo, “Mãe Fulana de Ogum traz a pessoa amada em três dias” será “Mãe Poesia de Ogum traz a pessoa amada em três dias”; “Compro seu carro: inteiro, batido podre, amassado…” será “Compro poesia: inteira, batida…” e por aí vai. Viaja nessa linha de ação, dê uma nova cara a seu trabalho poético, prepare seu panfleto (xerox, santinho etc.) e afins (não se prenda à idéia de material impresso) e vamos transformar a rotina em arte. Divulga essa convocação para amigos, a participação é livre e não causa mal à saúde. Em caso de chuva, faremos uns versos para ela. Maiores informações: Rodrigo Raro (tel.: 8131 8085, e-mail rodrigoaz20@yahoo.com.br). Presença confirmada de marcianos e caixeiros-viajantes. Confirmar sua presença até o dia 24/1 para divulgação no site do Movimento Arte Jovem Brasileira. Nos vemos lá!

2.1.07

POR NÃO ESTAREM DISTRAÍDOS

Clarice Lispector

Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que por admiração se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles. Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles. Por causa de carros e pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração. Como eles admiravam estarem juntos! Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que, estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.